A ARTE DA RUDEZA é insulto. Mas não é apenas insulto. É um insulto perverso, insolente e demencialmente elevado. «Winston, você não passa de um bêbedo», diz Lady Astor a Churchill numa festa social. E Churchill, sem perder a compostura, responde: «E você, minha querida, é feia. Mas amanhã eu já estarei sóbrio».
O MESMO Churchill, na Câmara dos Comuns, confrontado com as críticas de uma parlamentar inflamada: «Se eu fosse sua mulher, punha veneno no seu chá». E Churchill, sem perder a compostura, responde: «E se eu fosse seu marido, bebia-o».
AGORA tracem as diferenças. A nossa vida social, vendida pelas revistas da paróquia, pinga vulgaridade. As elites de um país definem esse país? Pois bem: as nossas elites mais visíveis são compostas por jogadores de futebol, apresentadores televisivos e concorrentes do Big Brother. Um cortejo grotesco, que diz tudo sobre Portugal.
As frases desta gente são deprimentes e vulgares. As fronhas são deprimentes e vulgares. Os amores são deprimentes e vulgares. As casas são deprimentes e vulgares. Os sentimentos são deprimentes e vulgares. As férias, invariavelmente no Algarve, são deprimentes e vulgares. Os gostos são deprimentes e vulgares. As opiniões são deprimentes e vulgares.
A roupa é deprimente e vulgar. A educação é deprimente e vulgar.
Tudo é deprimente e vulgar porque tudo surge infectado pelo vírus deprimente e vulgar da classe média arrivista e endinheirada, amante do exibicionismo saloio ou, então, da moderação pacóvia, obsessivamente preocupada com o decoro, a imagem, as aparências.
E em relação ao Parlamento, o que há para acrescentar? Dos 230 deputados, talvez trinta sejam pessoas alfabetizadas. Dessas trinta, talvez vinte consigam ler um texto sem mexer os lábios. Dessas vinte, talvez dez consigam escrever uma frase com sujeito, predicado e complemento directo. O que dizer dos restantes 200?
NÃO SE PENSE que a arte da rudeza pode existir sem humanidade. Pelo contrário: só pessoas invulgarmente humanas podem ser invulgarmente rudes. Serge Gainsbourg, outro patife nobre, disse um dia a um jovem cantor em ascensão: «Provoca, provoca sempre. Mas nunca deixes de ser humano». A rudeza é humanidade em estado puro. Puro e duro.
A ARTE DA RUDEZA é um património a preservar numa sociedade civilizada. E talvez seja a única coisa verdadeiramente importante a fazer para salvar este Portugal alinhado, deprimente, vazio e sombrio, povoado por criaturas alinhadas, deprimentes, vazias e sombrias.
Filhos, não obedeçam sempre aos vossos pais. Pais, não queiram ser como os vossos filhos. Rapazes, aprendam a abusar. Riam muito. Chorem ainda mais. Provoquem. Excedam-se.
Sejam inteligentes. Sejam elegantes. Sejam nobres.
E, puta que pariu, sejam rudes e humanos!